Só demorei pra postar porque minha vida tem tido um pouco de
agitação ultimamente. Imaginem vocês que um dia eu estava na rua, encontrei uma
moeda e... Enfim, fora ter que doar meu rim à máfia holandesa, está tudo bem
agora.
Se vocês virem por aí um cartaz de “PROCURADA”, não sou eu,
ok?
Muitas pessoas têm me cobrado para falar de várias séries.
Harry Potter, Desventuras em série, A Herança (mais conhecida por ‘Eragon’), O
Senhor dos Aneis, Morada da Noite (ok, esse ninguém me cobra)... Mas decidi por
um bem mais hardcore. Para comemorar o Dia da Toalha. Agora vocês entenderão porque tinha gente por aí com uma toalha na mão. Não, não era uma festa do banho coletivo do qual você não foi convidado.
Na verdade, eu demorei pra falar sobre essa série, porque é
preciso estar extremamente inspirada para isso. E, como a maioria das pessoas,
eu sempre tive minhas melhores ideias enquanto tomava banho, então decidi levar
meu PC para o banheiro, a fim de registrá-las.
Como qualquer pessoa normal faria.
Postei sobre isso no
facebook, pessoas comentaram, e não sei como, a conversa evoluiu para uma
possível estreia minha na indústria pornô e a possibilidade de ficar linda,
rica e famosa fazendo isso.
Não postarei mais sobre isso. Ideias absurdamente atraentes
podem surgir...
*pensando sobre o assunto*
*eu teria que me depilar com frequência muito maior*
*e pagar a conta d’água*
*desistindo da ideia*
Então, o texto que se segue foi escrito em inúmeras etapas -
cada vez que eu ia buscar referências em algum dos livros eu resolvia ler um
pouco mais e inexplicavelmente tinham se passado duas horas - e regado a muita
dinamite pangaláctica.
O livro mais vendido em toda a galáxia, exceto no setor ZZ9
Plural Z Alfa.
O Guia do Mochileiro das Galáxias é uma série de ficção científica de Douglas Adams, baseada em um programa de rádio do mesmo autor de 1978, que virou uma série de seis episódios da BBC e um filme em 2005. É uma trilogia de quatro livros, que por acaso são cinco, que conta as aventuras de Arthur Dent, Ford Prefect, Zaphod Beeblebrox, Trillian, e o melhor de todos, Marvin, o robô maníaco depressivo.
Quando eu comprei a série, confesso que não sabia nada sobre ela. Geralmente os livros que eu compro na loca me rendem ótimas surpresas – como o excelente livro de aventura Choque Mortal – enquanto outros muito bem recomendados provavelmente viram uma decepção – vida A menina que não sabia ler.
Mas minha única referência para o Guia era “Superdesconto
Submarino! Toda a coleção Guia do Mochileiro das Galáxias por apenas R$29,90!”.
E foi uma das melhores surpresas da minha vida. Provavelmente empatado com o
dia em que eu perdi a... Ahnn, foi a melhor surpresa da minha
vida, com certeza.
Os livros pingam ironia, tiram sarros de si mesmos, aplicam
conhecimentos gerais, física, biologia, astronomia, matemática, filosofia, teologia,
cultura geral e geek praticamente o tempo todo. E, mais importante, trolla o
leitor constantemente.
Exemplo:
– Sabe – disse Arthur – é em ocasiões como essa, em que estou preso em uma câmara de descompressão de uma espaçonave vogon, com um sujeito de Betelgeuse, prestes a morrer asfixiado no espaço, que realmente lamento não ter ouvido o que minha mãe me dizia quando eu era garoto.
- Por quê? O que ela dizia?
- Não sei. Eu nunca escutei.
Não sei vocês, mas sempre separei, instintivamente, as
pessoas ao meu redor se gostavam ou não de Simpsons. Se não, automaticamente as
tratava de um jeito diferente. De cabeça, agora, me lembro de umas quatro
pessoas, e já peço desculpas antecipadamente: a culpa não é minha se meu
subconsciente prefere pessoas que apreciam a boa e fina sátira! Minha consciência apenas segue ordens!
Depois de separar as pessoas nessas categorias, eu ia para
casa, assistia a algumas temporadas em Springfield. Depois lia uns capítulos do Guia. Depois via mais algumas em Springfield.
E daí me perguntava: COMO é possível alguém não gostar disso!?
Sério, não entendo. Se o estilo dele fosse difícil de ser
compreendido – como João Guimarães Rosa – ou fosse extremamente descritivo –
como Tolkien – com muito esforço, eu entenderia.
E só leio Senhor dos Aneis porque acho que o enredo supera
qualquer necessidade de se saber contar uma história. Poderia ser contada em forma
de hai cai, que ainda assim seria uma das melhores histórias já escritas.
Foco, Sarah, foco... Você fala sobre isso outro dia...
Mas sério, eu não entendo.
Ora bolas caraminholas, quantos autores de sci-fi você
conhece cujo personagem SECUNDÁRIO – O Pensador Profundo - descobriu a resposta para a pergunta que aflige a humanidade sobre a Vida, o Universo e Tudo Mais?
Quantos autores ateus você conhece que provam a existência e
a inexistência de Deus no mesmo parágrafo?
Quantas explicações para o fato do ser humano falar o óbvio
constantemente você conhece que são melhores que se não exercitarem seus lábios
constantemente, seus cérebros começam a funcionar?
Mas sério, eu não entendo.
E só aceito duas boas explicações para esse desgosto: ou
você tem ataques epiléticos inexplicáveis quando lê/ouve a palavra “galáxia”,
ou você tem síndrome de Asperger, que um dos sintomas apresentados é a
incapacidade de se entender o sentido metafórico de expressões, tais como
ironia.
Teste rápido de sarcasmo:
Você gosta desse cara?
O dono do sarcasmo-perfeito-na-tv.
Bem, o sarcasmo do livro é bem mais livre do que o de House.
Ninguém, na galáxia inteira fica te falando “oooooooooooh o seu sarcasmo é
ácido, por isso você afasta a todos e não quer amar ninguém, bla bla bla”. Ao
contrário, você pode até mesmo ser o presidente da Galáxia! Se bem que todo
mundo sabe que a função do presidente é desviar a atenção do poder, e que o
verdadeiro poder é controlado por alguém que conversa com uma mesa.
Mas mesmo
assim, ninguém diz pro presidente “seu sarcasmo protege seu coraçãozinho, mas
eu quero amá-lo!”
Malditas mulheres, sempre estragando os melhores seriados.
Não, no Guia, você lê trechos como esse:
O robô fez um gesto, levantando a mão.
- Eu venho em paz – anunciou ele, acrescentando após um longo momento de esforço adicional -, levem-me ao seu lagarto.
Ford Prefect, é claro, tinha uma explicação para aquilo tudo, enquanto assistia com Arthur às repetidas reportagens frenéticas na televisão que, por sinal, não tinham nada a dizer, além de anunciar que a coisa tinha causado um prejuízo tal, avaliado em tantos bilhões de libras e que tinha matado aquele outro número completamente diferente de pessoas, e depois repetiam tudo novamente, porque o robô, desde então, estava prostrado, balançando levemente o corpo e emitindo pequenas mensagens de erro incompreensíveis.
- Ele vem de uma democracia muito antiga, sabe...
- Você está querendo dizer que ele vem de um mundo de lagartos?
- Não – respondeu Ford que, àquelas alturas, já estava um pocuo mais racional e coerente do que antes, tendo finalmente sido forçado a tomar uma xícara de café -, nada tão trivial. Nada assim tipo isso tão compreensível. No mundo dele, as pessoas são pessoas. Os líderes é que são lagartos. As pessoas odeiam os lagartos e os lagartos governam as pessoas.
Ué – comentou Arthur -, achei que você tinha dito que era uma democracia.
- Eu disse – afirmou Ford. – E é.
- Então – quis saber Arthur, torcendo para não soar ridiculamente estúpido -, por que as pessoas não se livram dos lagartos?
- Isso sinceramente nunca passou pela cabeça delas – disse Ford. – Como elas têm direito de voto, acabam supondo que o governo que elegeram é mais ou menos parecido com o governo que querem.
-Quer dizer que eles realmente votam nos lagartos?
-Ah sim – disse Ford, dando de ombros -, é claro.
- Mas – perguntou Arthur, sem medo de ser feliz – por quê?
- Porque, se deixam de votar em um lagarto, o lagarto errado pode assumir o poder. Você tem gim?
-O quê?
- Eu perguntei - disse Ford, com um tom crescente de impaciência entranhando-se em sua voz - se você tem gim.
- Vou ver. Conte-me sobre os lagartos.
Ford deu de ombros novamente.
- Algumas pessoas dizem que os lagartos são a melhor coisa que já lhes aconteceu - explicou ele. - Elas estão completamente enganadas, é claro, completa e absolutamente enganadas, mas é preciso que alguém tenha a coragem de dizer isso.
- Mas isso é terrível - disse Arthur.
- Olha, meu camarada - disse Ford -, se eu ganhasse um dólar altairiano cada vez que eu ouvisse um fragmento do Universo olhando para o outro fragmento do Universo e dizendo "Isso é terrível", eu não estaria sentado aqui como um limão procurando por um gim.
Douglas Adams sambando na cara da sociedade.
E quando você começar sua busca pelo conhecimento do Guia,
ouça seu coração e ignore a ignorância (oi?) ao seu redor. Pessoas dirão que o
livro é pura ficção e entretenimento. Dirão que nada daquilo é real. Que eu devo largar o Guia e sair ao sol, pelo menos uma vez por semana. Que
relógios digitais são uma boa ideia.
Não acredite nessa gente.
Em “O Guia do Mochileiro das Galáxias”, aprendi algumas
verdades sobre o mundo, e também que estou no setor mais sem graça do universo,
onde a toalha não tem o seu devido valor reconhecido. E aprendi a temer a
Chegada do Grande Lenço Branco. E aprendi qual é o sentido da vida.
Em “O Restaurante no Fim do Universo” eu tive uma aula de
filosofia melhor que todas as que eu tive no colégio e na faculdade somadas.
Descobri a verdadeira origem da girafa, e também quanto é seis vezes sete.
Em “A Vida, o Universo e Tudo Mais”, aprendi sobre como a
sociedade funciona melhor do que qualquer sociólogo por aí poderia explicar. E
que um sofá vermelho flutuando numa Terra pré-histórica tem mais importância do
que você pensa.
Em “Até mais, e obrigado pelos peixes!” aprendi mais sobre
física, química e astronomia que o próprio Mundo de Beakman pôde ensinar. E
aprendi a rezar por Bob.
Em “Praticamente Inofensiva”, aprendi que nada é o que
parece, e nem tudo tem o final que você deseja.
Em “E tem mais uma coisa...” eu não aprendi nada, pois ainda
não li. Não foi escrito por Douglas Adams, e sim por Eoin Colfer
.
Espera, o quê? WTF?
Sim, isso mesmo. Parece que muita gente não ficou feliz com
o final do quinto livro – também, pudera né? – e foi feito um
concurso para escrever o último livro. A versão desse cara foi considerada a melhor versão pós-mortem literária já feita, e seu livro também é considerado um final alternativo ao
quinto livro, o que é estranho, porque o quinto livro já é considerado um final
alternativo para a série. Tudo, isso é claro, devidamente autorizado pela família Adams.
Aposto que foi ideia da Mãozinha, aquela sapeca...
...
Piada ruim, ok.
...
Parem de ficar me recriminando, podemos voltar ao texto!?
É sério, eu costumo recomendar essa série a qualquer um que
saiba ler. Se você não gostar, por favor, não espalhe. Diga que você é
analfabeto, diga que só lê em aramaico e não traduziram ainda, diga que se não
puder ler ao contrário sem aparecer uma mensagem do demônio não tem graça, DIGA
QUALQUER COISA, mas não diga que não gostou.
Por favor.
O que eu tento dizer nesse texto é que essa série me fez
abrir uma nova categoria de livros na minha cabeça. A categoria “Estilo-Guia”.
Bem ao lado de “Estilo-Luis-Fernando-Verissimo” (na minha opinião o único que
poderia se equiparar a Douglas em humor).
Talvez por isso eu relutasse tanto em assistir ao filme.
Afinal, como poderiam traduzir em imagens, por exemplo, toda a indignação que
Wonko, o São, sente pela humanidade? Como explicar a vidinha pacata que Arthur
tentava levar pela galáxia, sem perder pelo menos quarenta minutos de explicações?
Tinha medo, muito medo...
Mas após muita
insistência, dois litros de vodka e sutis ameaças de exposição
pública de certas fotos íntimas, eu finalmente aceitei, esperando qualquer
coisa dessa película. Qualquer coisa mesmo. Se a Samara saísse da tela eu não
me surpreenderia.
E enquanto todos ao meu redor riam às lágrimas com Zaphod,
ou se indagavam sobre a criação do motor da improbabilidade infinita, eu me
peguei admirando e babando em silêncio sobre a genialidade sem fim de Adams;
como ele conseguiu fazer uma sinopse de cinco livros com assuntos aparentemente
sem nexo, e transformá-los em um filme que fizesse sentido; como ele teve a
grande sacada da Arma do Ponto de Vista e dos seres Perseguidores de Ideias no
solo de Magrathea; como o filme conseguiu caracterizar os vogons à perfeição;
como diversos símbolos dos livros foram inseridos, mesmo sem terem conexão com
a história do filme (os caranguejos feitos de pedras preciosas e a estátua de
Arthur que Agrajag fez sequer são mencionados pelos personagens, mas estão lá);
como ele conseguiu até mesmo colocar alguns velhos clichês cinematográficos aparentemente
obrigatórios (por favor, acha mesmo que Douglas Adams iria fazer espontaneamente
um final tão ruim assim para Arthur e Trillian?), e ainda assim arrancar
aplausos da plateia.
Não estou dizendo que o filme é uma alternativa à série. Isso nunca
aconteceu, exceto em Game of Thrones. Mas supera as expectativas, e ainda assim
com certeza é um filme diferente de todos os outros.
Talvez O Guia do Mochileiro das Galáxias seja que nem os
Simpsons. Tem que ter um motivo muito bom para não gostar. Como ser um vogon,
sei lá.
Com certeza a conversa mais interessante do mundo seria
entre House, Douglas Adams, Luis Fernando Verissimo e Homer Simpson.
Principalmente porque a parte de Adams teria que ser mediada por um médium(oi?²),
já que ele morreu no dia 11 de maio de 2001. E o mundo chorou com isso. E todos
se uniram e elevaram suas varinhas aos céus em direção à Marca Negra de Voldemort para
fazer uma homenagem a um dos maiores gênios da humanidade, criando o Dia da
Toalha. O dia 25 de maio foi escolhido tanto porque foi a data do lançamento do livro quanto para fazer uma junção com Dia de Star Wars (quando estreou o primeiro filme, em 25 de maio de 1977) e também pelo "Glorioso 25 de Maio" para os fãs da série Discworld; tudo isso juntou-se dando origem à Santíssima Trindade do Dia do Orgulho Nerd. No caso do Guia, dia pessoas desfilam com suas preciosas toalhas - essenciais para um mochileiro das galáxias - por aí.
(Não SÓ de toalha, por favor,
que esse mundo ainda é um mundo de família.)
Simples, e ao mesmo tempo
simboliza a importância que O Guia do Mochileiro das Galáxias tem para nós: nos
sujeitamos a ser linchados na rua só para declarar o nosso amor.
Parabéns, Douglas Adams. Feliz Dia da Toalha pra você, e Feliz
Dia do Orgulho Nerd a todos nós.
É a sua cara Sarah!!!
ResponderExcluirGostei criativo.
Sarah, muito bom como sempre! Eu realmente sou um fã do humor sarcástico, o que sobra em seu blog. Me gusta.
ResponderExcluirE esse trecho do cara "sambando na cara da sociedade" - eu ri com essa - é simplesmente FODA!
A propósito (ou não): qual o sentido da vida que você aprendeu?